O Maior Acidente Radiológico: Césio-137 e Suas Consequências

O acidente com o Césio-137 em Goiânia, ocorrido em 1987, é considerado o maior acidente radiológico registrado no mundo. Ele começou quando um aparelho de radioterapia, abandonado em uma clínica desativada, foi desmontado por catadores de sucata, liberando a substância radioativa Césio-137. Esse trágico evento resultou em contaminação em massa, causando mortes, doenças graves e impactos ambientais, além de deixar profundas cicatrizes sociais e psicológicas na cidade de Goiânia e em todo o Brasil.

 

Como aconteceu o acidente com Césio 137 em Goiânia (GO)

Em 13 de setembro de 1987, em Goiânia, capital do estado de Goiás, localizado na região Centro-Oeste do Brasil, Wagner Mota Pereira, de 20 anos, e Roberto Santos Alves, de 21 anos, entraram no Instituto Goiano de Radioterapia (IGR) e viram um aparelho de radioterapia abandonado. 

Wagner e Roberto queriam apenas comercializar as peças do equipamento e ganhar alguns trocados. Mas involuntariamente, ao removerem o lacre da cápsula do equipamento deixado no instituto em ruínas, deram início a uma série de acontecimentos que desencadearam o maior acidente radiológico registrado até hoje em todo o mundo. 

Cinco dias depois de Wagner e Roberto terem retirado parte do aparelho radiológico do IGR, em 18 de setembro de 1987, Devair Alves Ferreira, na época com 36 anos, dono de um ferro-velho na Rua 26-A, do Setor Aeroporto, bairro residencial de Goiânia, comprou o cilindro de metal com cerca de 98 quilos e o armazenou em seu depósito. 

Devair desconhecia o perigo que aquele objeto trazia consigo. O cilindro continha Césio-137, material radioativo utilizado em procedimentos de radioterapia no tratamento de câncer. Após armazenar a peça em seu ferro-velho, ele observou um brilho azul que emanava de dentro do objeto, o que lhe causou grande fascínio.

Encantado com o brilho misterioso, posteriormente, ele fez uma declaração que marcou a história por seu teor ao mesmo tempo trágico e poético: “apaixonei-me pelo brilho da morte”. E de fato, as 19 gramas da substância, até então desconhecida, mudaram para sempre a história daquele homem, e trouxeram lancinante dor para Devair, para sua família e para todos os demais que se aproximaram dela. 

Césio-137 acidente radiológico
Vista aérea do terreno da Rua 57. Foto: CARA
O Césio-137 começa a ser espalhado

Devair decidiu levar a cápsula para casa, compartilhando sua descoberta com familiares e com amigos, que também ignoravam os riscos. A substância, que era um pó semelhante ao sal de cozinha, reluzia no escuro.

Nos dias seguintes, Devair distribuiu partículas de Césio-137 para parentes e amigos que o visitaram. Logo nos primeiros dias, quem teve contato direto com a substância sentiu tonturas, náuseas e teve crises de vômito e de diarreia. Esses são sintomas comuns de doença aguda por radiação.

Desconhecendo a relação entre os sintomas e o manuseio da peça, o irmão de Devair, Ivo Alves Ferreira, morador do bairro vizinho, Setor Norte-Ferroviário, foi conhecer a novidade e levou fragmentos do pó misterioso para casa, espalhando-os sobre uma mesa. 

A filha de Ivo, Leide das Neves, de 6 anos de idade, brincou com a substância e depois comeu ovo com as mãos sujas, ingerindo fragmentos radioativos. A criança foi a pessoa mais afetada pela radioatividade, e é o maior símbolo da tragédia que se abateu sobre Goiânia.  

Até hoje, a mãe de Leide, Lourdes das Neves, relembra de forma vívida desse episódio. “Eu senti algo ruim no meu coração, quando vi a Leide daquele jeito. Mas fui tomar banho…talvez se não tivesse ido tomar banho a Leide não tivesse comido ovo com Césio”, lamenta, com o semblante pensativo, e o coração pesaroso mesmo passadas quase quatro décadas do acontecimento. 

O irmão de Devair e de Ivo, Odesson Alves Ferreira foi outra vítima do acidente radioativo que aconteceu em Goiânia. Na época, ele tinha 32 anos, e teve contato com o Césio-137 por apenas uma vez. Odesson que se tornou um grande representante das vítimas do acidente, leva até hoje na mão a marca desse encontro. 

Em 26 de setembro, Devair lhe mostrou os fragmentos de pó e questionou se ele considerava ser possível adornar um anel com a substância. Odesson tomou um pouco do pó e o esfregou sobre a palma da mão. Posteriormente, Odesson relatou que não deu muito valor ao achado do irmão. Mas naquele momento, ele já estava sob o efeito da radiação, e dias depois coceira e inchaço na mão começaram a incomodá-lo. 

 

A suspeita

Uma simples dona de casa, a esposa de Devair, Maria Gabriela, foi a responsável por encaminhar o material para a sede da Vigilância onde seria confirmado, posteriormente, que se tratava de substância radioativa. 

Maria Gabriela tinha 37 anos, quando começou a suspeitar que o mal estar da família estava associado à presença daquela substância que havia chegado ao seu lar. A vizinha de Maria Gabriela, Santana Nunes Fabiano, a incentivou a investigar melhor o assunto. 

A dona de casa levou a cápsula, no dia 28 de setembro, para a Vigilância Sanitária, localizada no Setor Aeroporto. Ao chegar ao local, ela relatou toda a história ao diretor da unidade, Paulo Roberto Monteiro. Uma sacola de ráfia contendo a cápsula foi deixada sobre uma cadeira no pátio da sede da Vigilância.

 

A confirmação

O físico Walter Mendes, da Comissão Nacional de Energia Nuclear, foi o responsável por confirmar que o material desconhecido era realmente radioativo. Walter tinha 29 anos quando entrou para a história como o profissional que identificou inicialmente o acidente radioativo, em 29 de setembro de 1987.

O produto havia ficado por um dia sobre uma cadeira no pátio da Vigilância. O físico pediu apoio ao escritório regional de Goiânia da Empresas Nucleares Brasileiras S/A (NUCLEBRAS) – estatal extinta em outubro de 1989 – para pegar um aparelho de medição de radiações ionizantes. 

Após analisar o material, Walter pediu para que todas as pessoas deixassem o prédio da Suvisa. Em seguida, o Corpo de Bombeiros e a Polícia Militar isolaram o acesso ao prédio da Vigilância Sanitária.

 

Como aconteceu a descontaminação radiológica de Césio-137 em Goiânia

A cronologia dos fatos foi oficializada no documento “The Radiological Acident in Goiânia” produzido pela Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA), em 1988. Em 13 de setembro de 1987, um aparelho utilizado em radioterapia foi violado, fazendo com que indivíduos e áreas da cidade de Goiânia, capital do Estado de Goiás, fossem contaminados com Césio 137.

O processo de descontaminação da capital foi iniciado em 30 de setembro de 1987 e concluído no mesmo ano, em 21 de dezembro. No documento “Relatório do Acidente Radiológico de Goiânia” foi apresentado em 10 de março de 1988, pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), em audiência no Congresso Nacional à Comissão Parlamentar de Inquérito do Senado Federal, atestando a descontaminação de Goiânia. 

 

Quantas pessoas foram contaminadas no acidente com Césio-137

Foram monitorados 112.800 indivíduos, dentre os quais se identificou algum grau de contaminação em 249. Em 120 indivíduos desse grupo constatou-se apenas contaminação externa, nas indumentárias. Os outros 129 indivíduos precisaram de acompanhamento médico especializado. Desses, 30 receberam assistência em isolamento. Vinte pacientes foram encaminhados para tratamento hospitalar. Dentre esses, 14 tiveram o estado de saúde agravado e foram transferidos para a unidade referência no atendimento a vítimas de acidentes com material radioativo, o Hospital Naval Marcílio Dias, no Rio de Janeiro (RJ). 

 

Quantas pessoas morreram após o acidente com Césio-137
Quatro indivíduos morreram em decorrência da Síndrome Aguda de Radiação. De acordo com a organização administrativa do Governo de Goiás e a lógica das políticas públicas de saúde, desde 1987, instituiu-se unidades para prestar assistência integral à saúde das vítimas.

 

O que aconteceu com os rejeitos radioativos do acidente com Césio-137

Os rejeitos do acidente geraram 6 mil toneladas de material que foram armazenados em um depósito em Abadia de Goiás, município vizinho à capital, desde outubro de 1987. O depósito também abriga a sede do Centro Regional de Ciências Nucleares do Centro-Oeste (CRN-CO), representante regional da CNEN, unidade responsável pelo monitoramento radiológico. 

Em Goiânia, todo o esforço na fase emergencial preservou muitas vidas. 

O acidente, apesar de seus diversos impactos, foi uma oportunidade de realizar “grandes acertos” criativos nos campos da saúde, da economia, da segurança, do desenvolvimento tecnológico, da política dentre outros.

 

Quanto tempo os rejeitos radioativos do Césio-137 terão efeito

A estimativa é que esses rejeitos percam o poder radioativo em cerca de 300 anos.

 

1 comentário em “O Maior Acidente Radiológico: Césio-137 e Suas Consequências”

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